Resumo:
- Um instalador hidráulico que era chamado de “gordo”, “negão” e “negão gordo” pelo supervisor deverá receber indenização de R$ 9,7 mil por danos morais;
- A decisão é do juiz Lucas Pasquali Vieira, da 1ª Vara do Trabalho de Canoas, que reconheceu o assédio moral;
- No mesmo processo, o trabalhador também ganhou direito a salário-substituição e diferenças de verbas rescisórias. O valor provisório da condenação, no total, é R$ 15 mil;
- Cabe recurso da sentença.
Uma empresa de serviços de engenharia deverá indenizar um instalador hidráulico que era chamado de “gordo”, “negão” e “negão gordo” pelo supervisor. A reparação foi fixada em R$ 9,7 mil.
A decisão do juiz Lucas Pasquali Vieira, da 1ª Vara do Trabalho de Canoas, considerou que as ofensas raciais e à condição física do empregado, praticadas por superior hierárquico e comprovadas pela prova testemunhal, caracterizam assédio moral vertical.
Na fundamentação da sentença, o magistrado ressaltou que as diversas formas de opressão, sobretudo raça, gênero, classe e condição física, no contexto do trabalho necessitam de enfrentamento pelo Poder Judiciário. Segundo ele, a intervenção judicial tem início pelo letramento e investigação das formas como o racismo, o patriarcalismo, a opressão de classe e outros sistemas discriminatórios criam desigualdades básicas que estruturam as posições relativas de negros, mulheres, raças, etnias, classes e outras.
Sob essa perspectiva, o julgador destacou que é dever do magistrado atuar na administração do processo de modo a assegurar o tratamento igualitário entre as partes, com observância do princípio da não discriminação por motivo étnico-racial e por outros marcadores. “Para além disso, deve o julgador levar em consideração que o seu contexto social, por muitas vezes, diverge daquele em que está a parte que busca ver reconhecido o seu direito”, ponderou.
O julgador ressaltou que, no caso do processo, o trabalhador está na interseccionalidade duplamente vulnerável por preconceito contra raça negra e sobrepeso. Segundo o magistrado, o racismo recreativo, que consiste na prática de ofensas racistas como se fossem uma brincadeira, não pode ser menosprezado. Ele ponderou, ainda, que a empresa possuía um canal de denúncias, que não foi utilizado pelo empregado, por medo de sofrer retaliações.
“As pessoas negras, ao longo da história, sofreram e ainda sofrem muitos estereótipos negativos, com rotulações que buscam inferiorizá-las, de forma direta ou indireta. É preciso, portanto, estar atento a todas as possibilidades de discriminação que podem ocorrer no ambiente de trabalho, afastando-se a ideia de naturalização ou de banalização do racismo ou mesmo que a imposição de apelidos em tom de brincadeira se distanciam da ideia de preconceito (racismo recreativo)”, argumentou o juiz.
Para o magistrado, no caso do processo, houve violação da obrigação contratual básica de a empregadora fornecer um ambiente de trabalho livre de ameaças e discriminação, o que causou angústia e sofrimento no trabalhador, violando sua dignidade, imagem e honra. Nessa linha, o julgador considerou caracterizados os pressupostos de existência da responsabilidade civil da empregadora, com base nos artigos 186 e 927 do Código Civil. Por consequência, julgou procedente o pedido de indenização.
No mesmo processo, o trabalhador também ganhou direito a salário-substituição e diferenças de verbas rescisórias. O valor provisório da condenação, no total, é R$ 15 mil.
Cabe recurso da sentença.
Fonte: Bárbara Frank (Secom/TRT-4)